sábado, 6 de junho de 2009

Coisas de Mulher


O final de semana era um tormento na cabeça de Nicinha porque o maridão Oscar se embonecava todo no poleiro, só esperando dar meia-noite para sair batendo as asas e desencantar para o mundo.
Não adiantava reclamar, fazer chantagens ou dormir na casa da mamãe. A reunião com os amigos do boteco era sagrada e não tinha folga ou dia Santo.
Com lágrimas nos olhos ela gritava que Oscar não era mais aquele de antigamente e que havia se transformado em um monstro cruel.
Sentia-se uma pobre coitada e dona exclusiva de dois quilos de bob’s. Mas, pra quê? Simplesmente para que ele preferisse ficar na gandaia com um monte de homens peludos, voltando no outro dia cedinho com aquela cara de peixe frito como se nada tivesse acontecido!
Como ficaria o seu coração de mulher? Estraçalhado, é claro.
Então, só de birra, comia tudo o que tinha na geladeira, tentando vencer a solidão abraçada a uma panela de macarronada.
- Só você para me compreender, panelinha gostosa!
Oscar fazia chantagem, dizendo que voltaria para Minas Gerais , sozinho e assim Nicinha fingia em concordava com tantas picaretagens.
Ele sempre estava engomado; roupinha da moda, cabelinho com gel, sapato bico fino, desfilando pelos ladrilhos do quintal a procura da chave do fuscão dourado .
Ela nunca estava penteada, cheirosa ou sensual...Nicinha se resumia apenas numa camisola florida, um pouco manchada de cloro, um chinelo de dedos e perfumada naturalmente por cremes de cebola.
Pobre Oscar,era mais atraente encarar o padeiro da esquina que aquele trator empacado!
Às vezes passava de leve o olhar sobre a própria mulher e suspirava aliviado por saber que ainda tinha os amigos de boteco.
Não que desgostasse de Nicinha, pois sempre foi uma pessoa interessante e tinha lá a sua graça, mas de uns tempos pra cá relaxou de vez.
Ficou implicante, ranzinza e o único lugar que a deixava descontraída era a feira, onde soltava a voz brigando com os vendedores.
Depois voltava pra casa muito mais tranqüila.Com a gola do vestido toda suja de caldo de cana, se esbugalhava no chão da sala, folheando uma fotonovela antiga.
Os amigos de Oscar conheciam Nicinha apenas por fotografia, que foi tirada no baile de formatura e achavam que ela era um violão.
Na última briga, ela não quis saber de mais nada, arrumou as suas malas e evaporou para bem longe dali.
Enquanto o ônibus chacoalhava, a sua vida foi passando feito um filme diante de seus olhos e percebeu que também havia contribuído para o triste fim de um romance:
- As pessoas só fazem com a gente aquilo que permitimos, que deixamos acontecer e muitas vezes por falta de amor próprio...-concluiu.
Nicinha foi para casa da mamãe, apenas para dar um tempo e voltar muito mais poderosa.
Conseguiu emagrecer, mudando toda a sua alimentação. Deu um bom corte no cabelo e pintou de caju.Trocou todo o guarda-roupa no brechó da esquina e ressuscitou para o mundo.
Quando Oscar estava se engomando para mais uma noite no “crime” e viu aquela sereia de pernas cruzadas em sua cama, quase enlouqueceu.
Era um milagre da natureza!
- Que mulher é esta, meu Deus?
Lá estava Nicinha, totalmente renovada, pronta para arrepiar!Sair com os amigos peludos e cheirando a suor?! Nunca mais.
Aliás, agora Oscar só saia do quarto para pedir trégua, mas bem baixinho, de medo que alguém escutasse!


SILMARA TORRES RETTI

Nenhum comentário:

Postar um comentário