terça-feira, 9 de junho de 2009

Uma Mulher de Ouro


Tem mulher que por infelicidade do destino, se casa com o bonitão e ainda leva de brinde o Kit Família, muito bem representado pelo Diretor Oficial: o cunhado.E não é um cunhado comum, não senhor. É daqueles que almoça e janta todos os dias e só levanta da cadeira para cair de boca...no fogão. Pede emprestado cigarro, vale-feira, vale-transporte e até vale tudo, já fazendo parte da mobília da casa, porque sua cara de pau combina perfeitamente com a estante de peroba da sala.E uma não vive sem a outra; é a peroba e a cara.A cara e a peroba!
Dona Pina que o diga...Foi casada durante vinte anos com seu Coimbra, um Zé Munheca do caramba que não repartia nem o cabelo, só de medo que alguém lhe tirasse o que tinha e o que não tinha.
Mas o destino é uma caixinha de surpresas e numa manhã de domingo, enquanto voltava da banca de jornal do Didico, se derreteu na calçada, como um suco de quiabo.O infeliz teve um mal súbito fulminante, ainda com o troco da revista espremido entre os dedos da mão.
Não teve quem conseguisse lhe arrancar as moedas, sendo que Dona Pina foi chamada às pressas para ajudar a socorrer o vitimado.
Pronto, por recomendações médicas, estava de molho.Agora seu Coimbra era o “dodóizinho” da casa, gemendo o tempo inteiro, de touca vermelha e enrolado num cobertor de lã.Santa paciência!
Dona Pina envelheceu cem anos! Ela lhe dava sopinha de legumes na boca, água fresca da bica no pote, doce de goiaba na colher...Do jeitinho que ele mais gostava! Enquanto seu Coimbra se recuperava aos poucos, Dona Pina se definhava rapidamente.Ela havia se transformado na sua enfermeira de Plantão, correndo pela casa a todo vapor com uma bandeja de inox equilibrada na própria cabeça.Lá tinha todos os remédios necessários, inclusive a lista das tarefas diárias: fazer a barba, cortar as unhas do pé, massagear as costas, contar histórias pra dormir...Tudo com muito carinho, é claro!Porém seu Coimbra não estava satisfeito e desconfiava de tamanha dedicação, achando até que tanto carinho assim tinha um nome: sua FORTUNA, muita bem enterrada no fundo do quintal, dentro de uma lata de marmelada.Na sua cabecinha de alho, pensava que Dona Pina estaria lhe aplicando um golpe daqueles, querendo mesmo que ele batesse as botas de uma vez.Só que seu Coimbra era um lunático e nem se deu conta que aquele dinheirinho minguado não valia nada diante do grande amor que Dona Pina lhe oferecia todos os dias e de graça.
Então,como não conseguia levantar da cama e muito desconfiado da própria mulher, mandou um convite para Bitello passar uma temporada com o casal.Na verdade ele queria que o seu irmão caçula lhe rastreasse todos os passos, contando detalhes secretos da sabichona.
Para Bitello foi um prato cheio e quase morreu de felicidade! Agora sim teria casa, comida e roupa lavada, no maior capricho do mundo.
Ele chegou, chegando. Exigiu até um quarto com vista pra rua, colchão ortopédico e travesseiro antialérgico.Após uma semana de hospedagem, já ficava de ceroula no portão da frente e tomava sol pelado em cima da laje.O cunhadão se sentia o Rei do Mocó, metendo o “pitaco” na vida íntima do casal e fazendo piadinhas picantes sobre o jeito sinistro que o irmão contava as moedinhas, uma por uma, sem se dar conta que o seu verdadeiro tesouro chamava-se Dona Pina.
Seu Coimbra estava doente, de dentro para fora, e não conseguia perceber a grande mulher que possuía.Mas se ele estava cego, Bitello enxergava até demais.Aos poucos foi reparando melhor nas qualidades de Dona Pina, sempre prestativa e dedicada.
- Que potranca! – babava pelos cantos.- Essa tá no papo.
Ela era uma mulher honesta e não merecia tanta desconfiança assim. Nisso Bitello caiu de quatro e, totalmente apaixonado, rendeu-se aos seus encantos. Da noite para o dia, mudou completamente o seu jeito de ser.Arrumou um emprego no açougue do Binho, comprou roupas novas e passou a ajudar nas despesas da casa.E durante a madrugada ainda tinha energia de sobra para lhe servir um chazinho com bolachas.
Os dois já não disfarçavam mais nada, dando “bituquinhas” de amor embaixo das barbas de seu Coimbra. Ele aprovou rapidamente o romance, desde que pudesse continuar morando num quartinho no fundo do quintal, só para ficar mais próximo da latinha de marmelada.
Seu Coimbra já era um homem rico, muito mais rico do que imaginava, porém preferiu ficar com suas moedas antigas, guardadas durante anos no maior sigilo do mundo. Enquanto que Bitello enriqueceu de vez, porque tinha com ele a verdadeira fortuna daquela casa: o carinho de dona Pina.
Porque ela investia na produção, multiplicava os chamegos e fazia render a poupança como ninguém! Existem riquezas na vida que somente os sábios de alma conhecem, valorizam e desfrutam, fazendo delas um caminho iluminado para a própria felicidade.

Silmara Retti

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